Saturday, November 28, 2009

A polêmica da revalidação dos diplomas médicos


Antonio Carlos Lopes*

Foi anunciado dias atrás que governo deve publicar no início de 2010 um edital com novas normas para o exame de validação dos diplomas de médicos formados no exterior. Estranhamente o comunicado não saiu do Ministério da Educação, órgão responsável por disciplinar tal matéria. Veio, sim, do Departamento de Gestão da Educação na Saúde, do Ministério da Saúde, por intermédio da diretora Ana Estela Haddad, durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, da Câmara dos Deputados.

Ressalto que a validação de diplomas de médicos estrangeiros, e principalmente de brasileiros formados em outros países, é um processo democrático e republicano. Contudo, são necessárias regras rígidas para não expor os cidadãos à incompetência profissional oriunda de modelos de formação inadequados ou insuficientes.

O que o governo tenta, na atual conjuntura, é mais um arremedo para esconder sua incompetência em conceber políticas consistentes para garantir a universalidade e integralidade do Sistema Único de Saúde (SUS). Busca mão-de-obra barata, de qualidade contestável, para colocá-la a atender em regiões de fronteira, de difícil acesso. Enfim, parece que planeja oferecer medicina de segunda para os carentes e desassistidos.

A ladainha de mudar o formato da validação tem origem na opção do governo de reconhecer a qualquer custo os diplomas de médicos brasileiros formados na Escola Latino-Americana de Medicina de Cuba, a Elam. É um grupo ligado a movimentos sociais com o qual tenta-se saldar um compromisso político.

Aliás, um acordo de cooperação entre Brasil e Cuba deu início ao processo, ilegítimo, diga-se de passagem. Data de 23 de outubro de 2003, o primeiro projeto de decreto apresentado para tratar do “registro recíproco dos diplomas de graduação e pós-graduação stricto sensu, conforme o disposto no Protocolo de Intenções na área de Educação, Saúde e Trabalho, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República de Cuba”, levando a assinatura do então ministro da Casa Civil, José Dirceu.

Em passado mais recente, depois de buscar solucionar esse nó por meio de diversas outras propostas de normativas, o governo tirou da cartola um novo projeto para a validação que teria como piloto justamente os estudantes da Elam; favorecimento puro. Brecado pelos protestos e pelo bom senso de entidades médicas e de forças democráticas, trabalha agora para impor à sociedade mais uma invencionice.

São, acima de tudo, atitudes de cunho ideológico e caráter puramente eleitoreiro. Chama a atenção o fato de o Ministério da Saúde ter tomado a frente dessa ação por intermédio do Departamento de Gestão da Educação na Saúde.

Há vários desvios graves nessa história. A começar por estarem passando por cima do Ministério da Educação em assunto que somente ao MEC diz respeito. Mas os equívocos são uma freqüente naqueles que respondem por disciplinar a formação no Brasil atualmente. Há pouco, por exemplo, acenou-se com a absurda oferta de 2.000 bolsas de residência médica para o eixo Norte/Nordeste, como se isso fosse resolver os problemas de escassez de assistência de qualidade em ambas as regiões.

Lamentável é que o governo dá poder a bacharéis em medicina que desconhecem o que é a residência médica. Residência é coisa séria; requer preceptoria competente, recursos humanos capacitados e materiais adequados ao aprendizado. É a pérola da coroa da graduação.

Faz três anos, foram oferecidas 250 bolsas de residência médica com finalidade semelhante. O retorno foi de apenas 20% de ocupação, sendo que, após um curto espaço de tempo, não havia nem 10%. Será que a experiência do passado recente não serve de orientação? Até quando teremos políticas inoperantes implantadas por quadros mais inoperantes ainda?

A residência médica é da alçada do Ministério da Educação, volto a frisar; mais especificamente da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM). O Ministério da Saúde tenta há tempos se apoderar do processo, mas é uma ingerência que deve ser denunciada e combatida.

Conseguimos, recentemente, a aprovação da regulamentação da profissão do médico na Câmara dos Deputados, que deve se confirmar em breve no Senado. É uma conquista importante para quem conhece os meandros da política, pois representa um revés a aventureiros de passagem pelo poder. É mais uma ferramenta para a sociedade exigir uma medicina séria e de qualidade.

* Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica

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